Estando praticamente na metade do Tempo Pascal (22º dia), celebramos, no 4º Domingo da Páscoa, o Domingo do Bom Pastor. Assim se chama porque nele, a cada ano, se lê um trecho do 10º capítulo do Evangelho segundo São João, no qual Jesus afirma ser o Bom Pastor. Por isso, este é o domingo em que cada cristão é chamado a rezar, de forma especial, pelas vocações sacerdotais e religiosas.
No entanto, no ciclo de leituras litúrgicas em que estamos (Ano A), curiosamente não aparece no Evangelho a figura de Jesus como Bom Pastor, mas Ele diz ser a Porta das Ovelhas (Jo 10,6). Não é difícil compreender que Jesus está se referindo ao acesso que, por meio dele, temos ao Pai (Jo 14,6). Porém, é possível fazer uma reflexão simbólica sobre este título que Jesus atribui a si.
Existia, no Templo de Jerusalém, uma porta chamada Porta das Ovelhas (Ne 3,1; Jo 5,2). Por ela eram introduzidas as ovelhas para os sacrifícios que seriam realizados. Ora, se pensarmos que o Templo é o lugar da experiência de Deus, e a Porta das Ovelhas como a possibilidade deste encontro, podemos ler, assim, o dito de Jesus: “Eu sou o meio pelo qual vocês podem fazer a experiência de Deus”.
Mas não basta afirmar isso: é importante lembrar que Jesus disse que a porta do Reino é estreita, e que muitos tentarão, mas não conseguirão entrar (Lc 13,24). Ora, lembrando da belíssima letra de um canto pastoral bem conhecido nosso, que diz: “A porta do Reino é a Cruz do Senhor nosso Deus imortal”, passar pela porta, que é Jesus, é, enfim, passar (Páscoa – Pessach) pela Cruz para alcançar a ressurreição.
Em nossos tempos, grande é a tentação de um cristianismo sem cruz. Muitos amam Jesus Ressuscitado e Glorioso, mas rejeitam Jesus Crucificado. Isso não significa que devamos amar a Cruz por si só, mas que devemos amá-la porque é por ela que chegaremos à ressurreição. O cristão não é um masoquista, mas igualmente não pode ser um triunfalista iludido: sua vocação tem como fundamento a Cruz.
São Paulo já nos advertia: “Há muitos que se comportam como inimigos da Cruz de Cristo” (Fl 3,18). Infelizmente, essa é uma realidade presente também em nosso meio! Quem não ama a Cruz, não pode ser cristão. Quem não a abraça em espírito de fidelidade ao Senhor, não compreendeu a vocação que recebeu. Passar pela Porta, que é Cristo, implica morrer com Ele, para ressuscitar com Ele (Rm 6,8). Por isso, o Senhor diz que o pastor passa pela Porta, e as ovelhas escutam a Sua voz e O seguem. Na Liturgia, temos a oportunidade de ouvir a voz do nosso Pastor (Sl 22,1), seguindo-O por onde Ele for, certos de que Ele nos guiará pelo caminho mais seguro (Sl 22,3).
Além dos inimigos da Cruz, há ainda outro perigo: o de seguirmos os ladrões e assaltantes (Jo 10,1). Esses não passam pela porta. Não nos iludamos: há mais ladrões e assaltantes do que podemos supor. Quem não defende a vida em todas as instâncias, quem despreza o outro por não pensar do seu modo, quem anuncia sucesso material como meta de vida, quem negligencia as dores dos outros, não é nem ovelha nem pastor: não passou pela Porta, Jesus. Não compreendeu o Evangelho. Por isso, precisamos ouvir a advertência de Jesus e não seguir estes falsos guias.
Estejamos bastante atentos para não nos deixarmos enganar e acabar sendo extraviados do redil. Para isso, precisamos estar sempre em oração pelo revigoramento dos nossos pastores e para que sejamos um rebanho obediente ao nosso Supremo Pastor. Ouçamos Sua voz, e poderemos descansar eternamente em seus prados.
05/05/2017 - Atualizado em 05/05/2017 10:34